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sábado, 18 de fevereiro de 2012

Piedade, desgraça e ignorância.

O circo da desgraça conjunta


Palmas para minha morte, velada no berço do meu amor próprio. Chorada pelos deuses que existem unicamente no olimpo de minha mente.
Palmas para meu pai, quimera secreta que devora minhas aspirações. Decifra-me, filho meu, e cuspo o que ainda te pertence.
Palmas para minha casa, prisão de minh’alma e corrente do meu ser. Proteção fajuta de minha própria ignorância.
Aplaudam bastante minha desgraça, conscientes de que ainda viverei em vocês.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Deus, vazio e poder.

Eu-deus...

Não sei se toquei o céu ou se o céu me tocou, mas nesse instante sou a pessoa mais completa do mundo. Com todos os meus sorrisos falsos e minhas vagas visões, meus egoísmos e meu ódio. Tão sublimes que quase entendo meus próprios planos. Tenho ideias para aquela velha puta sem destino, para aqueles bêbados que, enquanto loucos, entendem minha filosofia. Tenho o sopro da vida, para reavivar a fome de alguns moribundos. Tenho paixões perdidas, que esborram dor e abrem feridas. Gritos gelados sobre o vazio.
E ainda me lembro do velho astronauta que subiu aos céus em uma carruagem de fogo, ele buscava a mim... Só encontrou o nada e a dor. Eis que a verdade resume-se a busca de deus e o toque no vazio. E se em meus olhos enxergas o infinito, em meu coração só verias o vazio. Sou deus e, em meu nome, te destruo.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O mundo, o poeta e a criação.





No inicio era a palavra, e o poeta a escreveu. Do primeiro poema nasceu a luz, e a escuridão nasceu junto. Espalhou o poeta seus caminhos, e assim foi o primeiro dia. No segundo criou-se o sol e a este se presenteou com a dia, criou também a lua; poeta sem lua não existe. Como não havia luz para esta, criou o poeta as estrelas e os olhares, o desejo e o brilho. Estava feito o céu.
Criaram-se então grandes poemas que, com a violência da alma, se tornaram o mar. A mansidão raivosa e a beleza perigosa. Com sonetos costurou o poeta sua terra, deu firmeza a criação e completou o terceiro dia. No quarto dia vieram os cânticos, as bênçãos e as canções. Nasceram as aves e as árvores, uma para cantar e outra para escutar. Dedilhou-se o ar puro e a música deu a vida.
No sexto dia veio a prosa, pomposa como nenhuma outra. Deu vida e nome a grandes e pequenos animais, deu vida e nome a própria vida. As aventuras e os perigos. O poeta então sorriu, havia amado mais que tudo o urro do leão e o ruminar da vaca. Se poeta é isso, criar um mundo e se embelezar com quase nada. Vieram então grandes ideias e com elas se teceu os sonhos... Poemas complicados e rimados deram origem ao homem. Tirou-se uma costela do verso e se fez um poema ainda mais lindo: a mulher. Tratou o poeta de aconselhar: “Comei e bebei de toda a minha criação, pegai e levai aos lábios o fruto do conhecimento. Conheça o bem o mal e só assim serás humano.” Dito isso, amou o poeta sua criação.
No sétimo dia... Morreu o poeta, pois não sabe descansar e imortais são apenas suas poesias.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Instantes, vidas e suspiros.

Tenho eu poucos instantes, nesses poucos instantes muitas vidas. Nessas muitas vidas nenhum amor, e sem nenhum amor não vivo nem um pouco. E sem viver não suspiro e por isso não confio. Afinal, sabe-se bem que não se deve confiar em quem não suspira. Pois com suspiros se costura poemas e sem poemas a vida não tem graça, mesmo que sejam muitas e mesmo que sejam minhas. E eu que tenho poucos instantes, nesses poucos instante muitas lágrimas. Não que eu costume chorar, pois lágrima derramada não machuca, não assusta. O que realmente detém o ser são as lágrimas retidas que, por não esborrarem, não preenchem. As minhas mesmo pesam mais que as luas de meus espelhos, mais que os sóis que conto em minhas camas. E quantos corações já não tive que arrancar, quantos beijos já roubei. Motivos? Nunca tenho. Puro romantismo pagão. Pois tenho poucos momentos e em poucos momentos nunca sei o que fazer.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Fernando Pessoa, Álvaro Campos e as cartas de amor.



Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas).

Álvaro de Campos



Um blog ridículo porque é única e exclusivamente uma carta de amor, para mim mesmo, para todo o mundo. Para quem conheço, para quem vou conhecer e para quem nunca verei. Para quem amo e para quem odeio, uma única e ridícula carta de amor. ― Rogerio Murdoc.